domingo, 29 de abril de 2007

ESPELHO

No dia primeiro de maio de um ano qualquer, nasceu um menino forte, saudável e sem nenhuma aspiração, pois acabara de nascer. Seu nome, Castor, assim como o resto da família. E só por ele já era possível adivinhar qual seria sua profissão.

O pai Castor, que era uma pessoa muito culta e querida, fazia pontes e barragens. Ele não sabia se era querido por causa de seu ofício de utilidade pública, que era muito bem desempenhado, ou por que ajudava ao próximo desde as tarefas mais simples até as mais laboriosas. Porém, como qualquer outro Castor, tinha seus defeitos:

1- Sempre brigava com sua mulher na presença de seu filho;

2- Ao sinal de qualquer tosse ou espirro, ele entrava em pânico, pois pensava que era pneumonia, tuberculose ou qualquer peste jamais diagnosticada;

3- Dizia que dava o que o menino necessitava e não o que tinha vontade. No entanto, não constava nos atributos de sua mulher, um doce ser necessidade.

Foi assim que o pequeno Castor viveu seus primeiros quinze verões: vivenciando toda a personalidade que seu pai tinha. E, sem dúvida, tornou-se complexo para a família, problemático para a sociedade, porque quem o criava não era aquele Castor culto e querido, mas aquele que tinha esses defeitos facílimos de serem apontados. À escola, não ia, e quando ia, não sabia nem que professor havia entrado na sala. Existiam alguns amigos que ele gostava, pois vendiam doces de gente grande, mas seu pai não entendia por que eram tão caros.

Depois de muito custo, seu avô, muito sábio ou meramente desconfiado, obteve uma conversa com seu pai.

– Filho – disse o bom velhinho.

– Senhor – respondeu veemente o filho.

– Tu sabes que ando inquieto...

– Tu és inquieto por natureza – interrompeu o filho.

– Não comeces a me interromper, pois o que tenho para te falar é de suma importância.

– Sim, senhor.

– Como estava dizendo, ando apreensivo, porque vejo meu neto alienado. Por acaso, tu sabes qual é o sonho dele?

– Como?

O pai Castor não prestara atenção no que seu pai dissera. Seus olhos, como seu pensamento, não paravam. Era transparente a aflição estampada na face. Contudo, o avô sabia que era seu costume, já que um pingo, para os outros, era uma enchente para ele.

– Filho, presta atenção, pára de ficar vendo nuvens.

– Pois não, o que me perguntaste?

– Se tu sabes qual é o sonho do teu filho.

– Como posso eu saber?

– Faças teu...

– Amor, um café! – Novamente interrompeu a fala de seu cansado pai.

Sem titubear, o avô gritou:

– Ora, teu filho é um reflexo de ti!

E isso chamou a atenção do pai Castor que falava com a mulher.

– Como ousas, eu nunca fui expulso da escola e ele, a meu ver, não tem mais jeito. Até o senhor podes ver.

– Sim, posso ver e entender o que está acontecendo. A única diferença entre vós é que tu usas uma máscara e não mostras a tua verdadeira personalidade.

Sorveu um pouco de café e continuou:

– Desiste de teu filho e aí verás o que o pobre mundo fará com ele. Ambos parecem estar em pé de guerra.

– E como posso interromper essa linha já traçada? – retrucou o filho.

– Sei que cometi erros, porém nunca desisti de ti. Por isso, hoje tens um emprego e és respeitado. Não cometas os mesmos erros que eu, além dos que já estás cometendo. Faz teu filho sonhar e encontrar a razão de viver. E o mais importante: observa teu filho, não fiques desvairado.

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